O evento de consagração de Tania Magali (Ãgohõ Ãkirê Pataxó) como líder do povo Pataxó, realizado por Jaqueline Haywa, foi um momento significativo de cultura e luta por políticas públicas para o povo indígena. Realizado no dia 13 de maio de 2024, às 18h, no Consórcio do Grande ABC, na cidade de Santo André, o evento contou com a presença de diversos participantes, incluindo integrantes do projeto de extensão Africanidades da UFABC, coordenado pela professora Dra. Ana Maria Dietrich, como as pesquisadoras e tutoras do projeto: Suane Brazão e Claudia Rezende, a Ialorixá Adriana T’omolú e os mestrandos Allen Charles e Pamella Galvani Bulbov.
Imagem 1: Roseli Pataxó, Jaqueline Haywa, Vereador Ricardo Alvarez, Elaine Pankará, Tânia Magali, Cacique Marcos Pataxó Hã hã hã, cacique Som Pataxó e Nancy Pataxó

Fonte: Equipe Africanidades
Imagem 2: Wadson (convidado), Yalorisá Adriana d”Omolu, Allen Charles, Claudia Rezende, Tânia Magali, Pamella Galvani Bulbov, Suane Brazão; Jaqueline Haywa e Delma da tribo Pancará

Fonte: Equipe Africanidades
Logo nos bastidores, a Tânia e a Jaqueline nos presentearam com uma linda cena em que pudemos ver o processo de pintura dos rostos, momento cercado de companheirismo e de ansiedade. Ainda no átrio do prédio, os convidados começaram a chegar, trazendo alento e apoio para a homenageada e suas próprias pautas, que fortaleceram a ocasião.
Como presença VIP, estavam a esposa Clarissa Martins Santos e o filho Gael, da Tânia, que cercaram a então futura líder de muito amor e orgulho! Marcaram sua participação, o Vereador Ricardo Alvarez, do PSOL, que sempre esteve ao lado da causa indígena em seus projetos e que falou da importância que esse evento representou no dia da assinatura da Lei Áurea; Iara Bento, do S.O.S Racismo, que fez a devolução simbólica da terra para a Tânia e pediu perdão a ela em nome de alguns negros e em nome do presidente Lula; Patty Ferreira, vice prefeita de Diadema, que também se referiu força da simbologia do momento em uma data tão importante; a representante da secretaria da cultura de Santo André e Lavínia Oliveira, do projeto Xingú da UNIFESP, que abordaram a diversidade e a importância de respeitar os espaços; as queridas Claudia e Suane, falando de suas origens e da importância de desencastelar a academia e colocando o Africanidades na pauta; o Mestre Pelé do movimento antirracista, dialogando sobre igualdade; e conduzindo as formalidades, estavam o Cacique Pataxó Hã hã hã, que é primo da Tânia, o Cacique Son Pataxó e a cacica Jaqueline, que cadastrou mais de 300 pataxós no ABC no período de nove meses.
Imagem 3: Tânia Magali, filho Gael e esposa Clarissa Martins Santos

Fonte: Equipe Africanidades
Imagem 4: Tânia pintando o rosto da cacica Jaqueline antes do evento

Fonte: Equipe Africanidades
Ao fim, o promotor de justiça Steven Shuniti Zwicker, que atua em Santo André pela causa indígena e tem lutado lado a lado tanto da Jaqueline quanto dos demais membros da tribo, foi quem fez a transmissão do colar de líder para a Tânia, colocando também o cocar em sua cabeça com ajuda da Jaqueline. Momento sensacional e com certeza de arrepiar do qual a equipe Africanidades teve a honra de participar!
Ainda que estejamos no século XXI e que o direito à educação indígena esteja explícita na Lei 11645/08, estamos ainda distantes de considerar a riqueza e a potencialidade dos saberes indígenas, nosso modelo educacional insiste em negar-lhes o protagonismo, citando apenas notas pontuais de suas existências, desqualificando-os como participantes ativos nas soluções dos problemas que afligem o mundo.
Desacreditou-se e infelizmente insiste-se em desacreditar ainda hoje que os povos originários possam apresentar novas e criativas formas de viver e inter relacionar-se com o planeta. Lhes são exigidos os saberes formais e acadêmicos do capitalismo, assim como comportamentos e modos de vestir e habitar condizentes com o imaginário colonial, como uma chancela que autoriza a partir disso a divulgação de seus conhecimentos.
Isso acontece porque estamos estruturados pelo modo eurocêntrico de ser, impregnados por uma cultura imposta eugenista incompatível com a pluriculturalidade com a qual falam cada família em sua especificidade.
Embora tenhamos eixos gerais da educação brasileira por normativas importantes como a LDB[6], os PCNs[7], a BNCC[8], documentos que preveem fazeres pedagógicos qualificados e focados no sujeito como protagonista e, mais especificamente na RMESP[9], o Currículo da Cidade com sua abordagem freireana, proponente de práticas significativas, emancipados e em consonância com seu território, observamos que ainda estamos distantes de práxis capazes de romper com o paradigma da modernidade europeia promovendo saberes que ultrapassem o caráter utilitário de conteúdos curriculares estanques.
Por isso mesmo é imperiosa a necessidade de formação docente em EDH para que compreendam a importância da valorização da cultura dos povos originários, haja vista que as leis que assegurem a preservação de tais tradições, não garantem que elas sejam de fato colocadas em ação. Conforme as palavras da líder indígena Vanusa Kaimbé ” Ninguém defende o que não conhece…”, a cultura indígena, assim como a cultura afro-brasileira, precisam ser conhecidas, precisam ser apresentadas e apreciadas como outras formas viáveis e potentes do ser humano inter relacionar-se com o mundo.
Oferecer às nossas meninas e meninos, aos nossos jovens e adultos essas e outras possibilidades não se põe a serviço apenas da valorização das identidades, mas fundamentalmente favorecem a desestruturação não só do preconceito, cerne da disseminação de desigualdades e violências, mas também da maneira predatória que convivemos com o meio ambiente. Conforme as palavras de Tânia na cerimônia de reconhecimento de sua liderança: Somos parte da natureza.
[1] Mestranda em Políticas Públicas pela Universidade Federal do ABC, com bolsa CAPES; especialista em Processual Penal; graduada em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP. Vinculada ao Projeto de Pesquisa do CEBRAP “O Brasil, as Américas e o Mundo – política externa e opinião pública”. Atua como editora assistente das revistas Contemporâneos (Qualis/CAPES A1) e ContemporARTES (Qualis/CAPES B3) da UFABC e no apoio a gestão do Projeto de Extensão Universitária Africanidades da mesma universidade.
[2] Pesquisadora do Grupo de Educação em Direitos Humanos / Linha de pesquisa Africanidades, mulheres e Educação Antirracista nas infâncias, Docente da Rede Municipal de Educação de São Paulo. Especialista em Educação em Direitos Humanos (UFABC), outras especializações em Letramento; Literatura Infantil; Sociologia e Educação Étnico-racial; Direitos Humanos e práxis antirracista. Coautora do livro O que pode a escola vazia. Colaboradora do documento Currículo da Cidade de São Paulo Educação Infantil.
[3] Mestrando no programa de Pós-graduação em Ensino e História das Ciências e Matemática pela Universidade Federal do ABC, com bolsa concedida pela própria instituição. Graduado em História, bacharelado pela UESB, e Licenciado pela Universidade Estácio de Sá. Especialista em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC. Atua como participante do Projeto de Extensão Africanidades, com foco na Etnomatemática e Jogos como metodologia educativa. Além disso, leciona na Rede Estadual de Ensino, abordando os componentes Inovação e Tecnologia, História das Ciências e Filosofia.
[4] Especialista em docência do ensino superior, graduada em Gestão de Recursos Humanos pelo Centro de Educação Apoena (2015). Pesquisadora no tema identidade amazônica, corporeidade negras, gênero, cultura popular, produtora executiva do Zimba Cultura e do coletivo Amazonizando. É atriz, dançarina e cantadeira Arte-educadora, quilombola nascida em Macapá-AP, idealizadora do coletivo Amazonizando, que atua no protagonismo e nas das produções artística e intelectuais da Amazônia. Professora do Africanidades/ UFABC.
[5] Doutora do Bacharelado de Ciências e Humanidades da UFABC. Coordenadora da Pós Graduação Lato Sensu Educação em Direitos Humanos (UFABC). Formou 800 alunos entre 2014 e 2020. Coordenadora do Projeto de Ensino, Pesquisa e Extensão Africanidades, Literatura Infantil e Circularidade. Coordena grupo de Pesquisa CNPQ e grupo de Estudos sobre Educação em Direitos Humanos. Pós Doutora em Sociologia pela UNICAMP.
[6] Lei de Diretrizes e Bases da Educação- ou Lei nº 9.394/1996 define e regulariza a organização da educação brasileira com base nos princípios presentes na Constituição.
[7] Parâmetros Curriculares Nacionais- são diretrizes elaboradas pelo Governo Federal que orientam a educação no Brasil. São separados por disciplina. Além da rede pública, a rede privada de ensino também adota os parâmetros, porém sem caráter obrigatório.
[8] Base Nacional Comum Curricular é um documento normativo para as redes de ensino e suas instituições públicas e privadas, referência obrigatória para elaboração dos currículos escolares e propostas pedagógicas para a educação infantil, ensino fundamental e ensino médio no Brasil.
[9] Rede Municipal de Ensino da Cidade de São Paulo.
Referências
ADICHIE, C. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo estrutural. São Paulo : Sueli Carneiro; Pólen, 2019.
CARNEIRO, Aparecida Sueli. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. 2005. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.
BRASIL. Lei 11.645/08 de 10 de Março de 2008. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília.
