Profa. Esp. Maura Andrade Calheiros**

O presente artigo se pauta em minha experiência na formação educacional de alunos e alunas da EJA (Educação de Jovens e Adultos). Durante meus anos de docência, pude observar o quanto a EJA é importante para jovens e adultos que não tiveram acesso à educação na idade certa e também o quanto essa modalidade de ensino é importante na divulgação dos Direitos Humanos, buscando formar cidadãos e cidadãs e assim contribuir para uma sociedade mais justa.
Esses anos de experiência me possibilitaram também acompanhar vários relatos de alunos e alunas e, me permitiu descobrir quais eram os maiores problemas enfrentados por eles em seu cotidiano de trabalho. Por meio de várias rodas de conversa chegamos à conclusão que todos educandos tinham grande dificuldade em utilizar o dinheiro, eles não sabiam valorizar e nem gastar com responsabilidade. Outra descoberta importante é que a maioria deles eram trabalhadores informais como “sacoleiros”: vendedores ambulantes que vendiam bolo, vendedoras online, enfim, que se caracterizavam como pequenos empreendedores e que pouco conheciam sobre seus direitos. Diante desta constatação, surgiu a necessidade de ensinar a eles sobre Educação Financeira e, a partir daí, iniciamos com pequenos textos onde foi mostrado que eles eram um público-alvo para abertura de empresa do tipo MEI (Microempreendedor Individual), de modo que poderiam ter os seus direitos assegurados.
Na sequência, foram feitas várias pesquisas em sala, sob a supervisão dos professores, lidas várias bibliografias sobre a temática. Utilizamos ainda jornais de supermercados para fazer comparação de preços e, para que tivéssemos uma fundamentação teórica, realizamos várias rodas de conversa onde foram provocados alguns debates, e isso possibilitou que fosse explicado aos alunos e alunas o objetivo de se aprender sobre Educação Financeira e a legislação sobre MEI.
ANALISE DA IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO FINANCEIRA PARA OS ALUNOS DA EJA E OS DIREITOS HUMANOS
Conforme os estudos iam avançando, a Educação Financeira foi se tornando indispensável na vida desses estudantes da EJA e é importante lembrar que esse tema faz parte da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), promovendo o incentivo dos estudantes para se tornarem capacitados e autônomos em relação às atividades financeiras, tanto relacionado as tarefas do dia a dia, como também nas relações profissionais.
Embora a EJA esteja em pleno funcionamento, identifica-se que suas práticas de ensino ainda precisam de muito investimento e de recursos e que o corpo docente precisa de capacitação ampla, plena, adequada e continuada para atender a esse público bastante específico e que possuem especificidades muito diferentes dos alunos atendidos no ensino regular.
Segundo Ribeiro et al (2015), a matemática financeira como tema incluído no currículo das escolas auxilia no tratamento de questões próprias e específicas de um público também específico, a saber: os estudantes jovens e adultos, que precisam de ajuda (formação e qualificação) para a realização plena de suas atividades financeiras do dia a dia.
No ambiente educacional, ao serem inseridos temas envolvendo a Educação Financeira, os estudantes se sentem aptos para tomarem decisões coerentes relacionadas às questões financeiras, seja em sua vida pessoal, familiar ou na comunidade (SILVA; POWELL, 2013).
O cadastro do trabalhador autônomo no MEI o transforma em microempreendedor individual e isso significa que o trabalhador continua sendo pessoa física, pois mantêm seu CPF (Cadastro de Pessoa Física), mas também ele se torna pessoa jurídica (empresa) quando se cadastra no MEI.

O autônomo com MEI consegue legalizar sua situação de informalidade e passa a ter garantias, como a emissão de notas fiscais e uma série de benefícios, direitos e, claro, também deveres.
O optante pelo MEI poderá solicitar empréstimos, se pagar as contribuições do MEI e terá garantido benefícios e direitos previdenciários para ele mesmo e também para a família, como por exemplo: aposentadoria por idade ou invalidez; afastamento remunerado por problemas de saúde; salário-maternidade; cobertura da Previdência Social à família: auxílio-reclusão e pensão por morte. Concomitante à isso, precisamos lembrar que os Direitos Humanos incluem também o direito à vida e à liberdade, o direito ao trabalho e à educação, o que me faz entender que o direito à educação de qualidade e direito ao trabalho são direitos humanos fundamentais.
Em relação ao direito à educação de qualidade, o Art. 205, da Constituição Federal (1988), estabelece que:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988, p. 1).
A EJA é uma modalidade de ensino bastante peculiar, pois, se de um lado, seus estudantes são de faixas etárias muito variadas, por outro lado, estão em situações de vida social e econômica semelhantes e todos eles procuram estudar, buscando melhorar suas vidas pessoal, profissional e financeira. Eles e elas desejam, assim como todos nós, realizar seus sonhos e projetos de vida. Esses estudantes trazem consigo uma carga de experiências próprias vivenciadas na sociedade e nas comunidades das quais fazem parte, e depositam muita esperança de que os estudos na EJA lhes tragam resultados e uma aplicação mais imediata desses conhecimentos, já que a situação de vulnerabilidade social em que se encontram, também, uma urgência a ser sanada. (BEZERRA; SANTANA, 2011).
Como política pública, é função do poder público, promover uma educação de qualidade para jovens e adultos e, assim, contribuir não somente para a formação escolar, mas também para criar oportunidades na vida profissional desses estudantes. (SANTOS; SOARES; TORRES, 2017).
Sabemos ainda que, os alunos e alunas da EJA não conseguiram concluir seus estudos no tempo apropriado pelos mais variados motivos: distância da unidade escolar, falta de oportunidades de estudo, necessidade de trabalhar etc. (ARROYO, 2005) e que carregam consigo toda uma trajetória com muitos “nãos” e “portas fechadas”.
Assim, diante de tal realidade, que eu o grupo de educadores que comigo trabalham, − pautados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) e no parecer do Conselho Nacional de Educação da Comissão de Educação Básica (CNE/CEB) nº 11/2000 – buscamos promover aulas embasadas numa EJA função reparadora, função equalizadora e função permanente.
A reflexão sobre os temas da educação financeira na EJA visou disponibilizar para os estudantes conhecimentos e ferramentas que eles tanto precisam para poderem administrar, de forma eficiente e efetiva, os seus recursos financeiros.
Em relação aos Direitos Humanos, a qualificação em educação financeira promove a formação integral dos sujeitos enquanto cidadãos e, consequentemente, isso reflete em toda a sociedade, já que a sociedade é formada por todos nós. Portanto, ambos contribuem para a diminuição da desigualdade social, pois como nos foi possível comprovar, nossos alunos e alunas, após colocarem em prática na sua vida pessoal o que aprenderam sobre Educação Financeira na sala de aula, deixaram de ter prejuízo com seus bolos e/ou outros produtos que vendiam, pois passaram a organizar melhor sua vida financeira.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Identificamos que o sistema MEI foi diante da existência da desigualdade social, que se caracteriza principalmente na impossibilidade desses pequenos empreendedores pagarem todos os impostos que são exigidos das empresas, e isso resultaria que eles não teriam lucro algum em seus empreendimentos, fato que representa a impossibilidade de se viver dignamente e uma cruel violação Direitos Humanos.
Enfim, registro também que minha inserção no Curso de Pós-graduação Lato Sensu Educação em Direitos Humanos, oferecido pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e todo suporte recebido dos professores e professoras do curso, me permitiram ter êxito neste projeto de Educação Financeira junto aos meus alunos e alunas da EJA. Segundo a Profa. Dra. Ana Maria Dietrich, Coordenadora do Curso EDH/UFABC: “Educar em Direitos Humanos não é apenas conteúdo, tem que ser feito através dos Direitos Humanos e ser voltado para ação!”. E foi diante desta perspectiva, que eu entendi que a escola é o lugar correto para ajudar o aluno (a aluna) a ser inserido(a) na sociedade, tornando-se para mim, uma grande satisfação ao observar que o estudo o(a) ajudou na organização e gerência do seu negócio como microempreendedor individual. Além disso, quando o(a) aluno(a) percebe que o que ele(ela) aprendeu na escola o ajudou na sua vida pessoal ele(ela) se sente valorizado(a) para a sociedade e para a instituição de ensino.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Cidadania: do direito aos direitos humanos. São Paulo: Acadêmica, 1993.
ARROYO, M. G. Educação de jovens-adultos: um campo de direitos e de responsabilidade pública. In: SOARES, L.; GIOVANETTI, M. A. G. C.; GOMES, N. L. (org.). Diálogos na educação de jovens e adultos. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. p. 19-50.
BEZERRA, G. F.; SANTANA, M. S. R. Educação de jovens e adultos: modalidade de ensino e direito educacional. Interfaces da Educação, Paranaíba, v. 2, n. 5, p. 93-103, 2011.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
CAVALCANTI, M. (org). Gestão estratégica de negócios: evolução, cenários, diagnósticos e ação. 2ª ed. ver. e ampl. São Paulo: Thomson Learning, 2007.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1974.
MARSHALL, Thomas H. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967.
MEI FÁCIL. O que é educação financeira: dicas para o MEI. Blog MEI Fácil. 2022. Disponível em: https://blog.meifacil.com/financas/o-que-e-educacao financeira/#:~:text=A%20educa%C3%A7%C3%A3o%20financeira%20%C3%A9%20basicamente,para%20voc%C3%AA%20e%20seu%20neg%C3%B3cio. Acesso em: 17/02/2023.
SEBRAE. Educação financeira dos microempreendedores individuais. Relatório de pesquisa Sebrae, maio/2018. Disponível em:https://www.bcb.gov.br/nor/relcidfin/docs/art9_educacao_finanaceira_MEIs.pdf. Acesso em 17/02/2023.
Vídeo: II Semana de Direitos Humanos – A utopia que movimenta. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=P8H3NnpuVws. Acesso em 17/02/2023.
Vídeo: Aula Magna: Pensando em uma educação emancipadora. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HuvXLI8rE8Q. Acesso em 17/02/2023.

** Profa. Maura Andrade Calheiros é professora graduada em Pedagogia pela Faculdade das Américas, Especialista em Educação em Direitos Humanos pela UFABC, Pós-graduada em Docência do Ensino Superior – FCE, Especialista em Educação a Distância – FACONNECT , Educadora Social – Senac , Curso em várias extensões tendo como destaque Africanidades na UFABC. Possui experiência como docente há mais de uma década, atuando no Ensino Fundamental, na Educação de Jovens e Adultos e na Educação Infantil no Estado de São Paulo. Realiza palestras sobre processos de alfabetização e trabalhos voluntários em lar de idosos e hospitais. Contato: maurinhacalheiros@gmail.com

Agradeço imensamente a todos que contribuíram para publicação do meu artigo . Gratidão!
Maura Aparecida de Andrade Calheiros de Morais.
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Prezada Maura, eu que lhe agradeço em nome de toda equipe ContemporARTES, por sua confiança em nosso trabalho. Parabéns. Abraços. Profa. Dra. Silmar Leila.
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Perfeito e necessário ❤️
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Que bom que gostou Bárbara! Convidamos você a continuar acompanhando nossas publicações. Abraços, Profa. Dra. Silmar Leila.
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